domingo, 29 de junho de 2008

Do ódio do tempo

Eu odeio o tempo.
Tempo que não passa.
Passa, tempo!
Porque um dia quero dizer "já passou tanto tempo..."
Então, com a desculpa do tempo, vou fazer de conta que não sinto mais,
e talvez não sinta mesmo.
Corre, tempo!
Acelera o fim da dor,
que não é dor,
que é amor sozinho,
miudinho,
a olhar o ponteiro desse tempo que insiste em protelar.

Dos meus desejos


Meus desejos me sacodem.

Violentos, quase sempre.

E, por serem sempre assim,

não sei lidar com eles.

Talvez até devesse,

já que me ameaçam sempre do mesmo jeito,

mas sou tão miúda diante deles,

que me carregam, esses injustos, para pontos de mim onde nada vejo.

Fico cega de tudo, fico cega de mim.

Só vejo o objeto do meu desejo.

E o medo.

Não do meu desejo ou daquele que desejo,

mas dos assaltos de mim,

pois além de me levarem,

meus desejos me roubam.

Levam meu juízo.

Levam meu sossego e minha confortável alienação.

Deixam inquietude, apenas.

Desequilibrada troca essa, que me viola.

Fosse eu forte e corajosa,

tocava de mim meus desejos.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Bilhetinho para meu bem

Meu bem, sua companhia é macia feito leite morno. Eu te beberia todos os dias, principalmente quando eu busco aquele conforto que só a sua brancura me dá. Corre cá me dar seu colo, um beijo também, e ficar falando baixinho o que ainda vai ser, só para eu ter a garantia de que seu querer 'tá aqui juntim do meu.... Tarda não.




sexta-feira, 6 de junho de 2008

Inverno


Itaperuna é linda no inverno. Às vezes, na maioria das vezes, o inverno não alcança a cidade, mas, quando ele chega, meus dias viram festa e eu agradeço a Deus por acordar e ver a cidade fria e amarela. Talvez ninguém tenha reparado, mas Itaperuna fica amarela no inverno e tudo ganha mais cor porque o sol fica retocando a cidade à distância, como quem não quer nada, e, na verdade, sabe muito bem que há quem vibre diante desse espetáculo de cor.


O trabalho displicente do sol consegue fazer um milagre. A beira-rio, pobrezinha, tão duramente castigada, mas, mesmo assim, tão encantadora a certos olhos, atinge sua magnitude no inverno. Agora, há poucas semanas, um bando de garças deu para ocupar uma árvore tombada sobre o Muriaé, perto da Fundação, e ficar ali, também como quem não quer nada. Na verdade, talvez realmente elas nem tenham se dado conta, mas que grandeza de paisagem constroem na margem do triste rio... O rio fica bonito e nem as casas que avançam sobre suas margens e nem um restinho de lixo que insiste em estragar o prazer dos amantes do quadro conseguem enfeiar a beira-rio quando ela é tocada pelo sol no inverno.


Outra coisa que também gosto de fazer no inverno é observar as pessoas de Itaperuna. Elas procuram se agasalhar e o engraçado é que nem sempre a estação é rigorosa. Minha tese é de que elas querem ficar belas e acompanhar a beleza da cidade quando faz frio – e o trabalho do sol às vezes dura tão pouco.... De manhãzinha, as pessoas correm para o trabalho e eu fico pensando se elas não reparam no espetáculo amarelo.


Há invernos nos quais há noites em que o ar fica gelado, mas eu fico querendo ir lá fora, belamente agasalhada – como todas as pessoas de Itaperuna no inverno -, e andar pela praça da avenida como se fosse invisível e passar pelas pessoas, olhar para elas e ficar imaginando que são pessoas muito normais e com pensamentos muito engraçados e sem muita coragem de mostrar seus diários – como eu.


Itaperuna é linda no inverno. Linda, linda, linda. Pena que me falta tempo para apreciar. Mas um dia, num inverno desses em que Deus fizer mais uma das suas, eu vou sair à noite, no ar gelado e olhar as pessoas. No outro dia, pela manhã, que certamente estará banhada por aquela luz amarela que só achei no inverno de Itaperuna, eu vou tomar coragem e estender uma toalha na beira-rio e ficar apreciando o Muriaé espreguiçar. Igual a algumas pessoas que já encontrei paradas, mesmo fazendo frio, com peso jogado numa das pernas, mãos entrelaçadas para trás, a olhar encantadas para o coitadinho do rio.